A construção da nova fábrica da BYD em Camaçari, na Bahia, virou um escândalo trabalhista após uma operação de fiscalização do governo brasileiro revelar que trabalhadores chineses estavam sendo submetidos a condições análogas à escravidão.
Durante a ação, 163 operários foram encontrados vivendo em alojamentos precários, sem colchões para dormir, com alimentação armazenada no chão e apenas um banheiro para até 31 pessoas em algumas casas.
Novos detalhes da contratação destes trabalhadores da China foram publicados ontem, pela Agência Reuters.
Os trabalhadores foram contratados pela empresa chinesa Jinjiang, responsável pela construção da fábrica, e recebiam 70 dólares por turno de 10 horas de trabalho.
Esse valor equivale a mais do que o dobro do salário mínimo por hora na China, tornando a oferta atrativa. No entanto, o que parecia uma boa oportunidade se tornou um pesadelo devido às condições abusivas impostas pelo empregador.
Para serem contratados, os operários tiveram que entregar seus passaportes para a empresa, uma prática ilegal tanto no Brasil quanto na China.
Além disso, eram obrigados a depositar cerca de 900 dólares como garantia, valor que só seria devolvido após seis meses de trabalho, garantindo que não tentassem deixar a empresa antes do tempo estipulado no contrato.
O documento de três páginas assinado pelos trabalhadores incluía multas de 200 yuans, cerca de 27 dólares, para diversas infrações consideradas arbitrárias, como falar palavrões, discutir ou andar sem camisa dentro do canteiro de obras ou nos alojamentos.
Também havia uma cláusula que permitia à empresa prorrogar unilateralmente o contrato por mais seis meses, sem necessidade de nova negociação com os trabalhadores.
Especialistas em direito do trabalho afirmam que essas condições são típicas de trabalho forçado, pois envolvem restrição de liberdade, retenção de documentos e penalidades financeiras injustificadas.
Segundo o governo brasileiro, a BYD tem responsabilidade direta sobre o ocorrido, pois é responsável pelas ações de seus contratados no canteiro de obras.
A BYD anunciou sua chegada à Bahia como um marco para a geração de empregos e o desenvolvimento industrial da região, prometendo criar 20 mil vagas diretas e indiretas.
A empresa assumiu a antiga fábrica da Ford, que fechou as portas em 2021 e demitiu cerca de 5 mil funcionários.
No entanto, a decisão de contratar uma empresa chinesa para erguer a fábrica, em vez de priorizar trabalhadores locais, gerou descontentamento entre os sindicatos.
Mesmo após o escândalo, centenas de operários chineses continuam trabalhando no local junto com brasileiros. Sindicatos afirmam que trabalhadores locais também relataram problemas, como a falta de água potável no canteiro de obras.
O sindicato da construção civil já anunciou que pretende processar a BYD e a Jinjiang por conta das condições precárias e das irregularidades trabalhistas.
O governo da Bahia ainda vê a chegada da BYD como uma grande oportunidade econômica, mas deixou claro que a empresa precisa garantir trabalho digno e respeitar as leis brasileiras.
O governador Jerônimo Rodrigues afirmou que a expectativa continua sendo a criação de 10 mil empregos locais, mas alertou que a empresa deve corrigir qualquer irregularidade imediatamente.
A repercussão do caso também levantou preocupações sobre outros projetos chineses na Bahia, como a construção de uma ponte em Salvador orçada em 7,6 bilhões de reais, levantando temores de que a prática de uso de mão de obra importada e condições degradantes possa se repetir.
Para a BYD, que se apresenta como uma das líderes globais na eletrificação de veículos, o escândalo representa um grave golpe em sua imagem no Brasil.
Se a empresa não resolver as irregularidades e garantir melhores condições de trabalho, pode enfrentar resistência antes mesmo de iniciar a produção na nova fábrica.
Os sindicatos já alertaram que, caso os brasileiros não sejam priorizados nas contratações, a fábrica poderá enfrentar sua primeira greve antes mesmo de abrir as portas.
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